A combinação de eventos pós-Covid-19 tem exposto os conselhos e conselheiros a um nível de desafio inédito pela combinação de quantidade, complexidade e amplitude de temas que precisam ser debatidos e decididos.
Por Bernardo Cavour e Camila Junqueira
Primeiro, foram as decisões emergenciais de reação à crise para adaptar as empresas a uma redução abrupta de nível de atividade e ao contexto de isolamento social. Foi um período de muita agilidade e inovação das organizações, descrito por muitas como “cinco anos em cinco semanas”.
Depois, vieram os impactos da crise como catalisadores de grandes mudanças nos mercados e na sociedade. Um movimento que coloca em teste convicções e a validade dos planos estratégicos de longo prazo em vigência.
Esses impactos levam agora a novas rodadas de discussão, revisões de planos e decisões só que desta vez em temas, muitas vezes, novos para as organizações e com impactos de médio e longo prazo.
Como consequência, tem sido comum ouvir de empresas uma preocupação grande sobre a necessidade de mudanças para adequar modelos de negócio aos novos desafios e oportunidades.
Tudo isso em meio a um contexto de muita incerteza e que exige uma disciplina para gerenciar a operação e recuperar os resultados impactados pela epidemia.
Cada empresa, dependendo do seu mercado, modelo de negócios e momento tem naturalmente seu conjunto de pautas críticas para tomada de decisão. Hoje, além das pautas tradicionais, muitas pautas novas surgiram ou ganharam maior importância entre os conselhos de empresas de diferentes setores e portes. Entre as mais recorrentes destacamos:
Em decorrência dessa combinação de fatores, vemos a pauta de evolução do papel do conselho ganhando força nas organizações. A complexidade do momento exige processos decisórios mais assertivos e estruturados. Além disso, a imprevisibilidade e a percepção de um mundo em mudança exigem um aporte maior do conselho na discussão de cenários futuros que podem levar a mudanças relevantes e pouco óbvias de estratégia.
Como em muitos casos, essas discussões envolvem temas novos para a organização e temos visto um aumento na busca de conselheiros que possam aportar de forma relevante neste novos e críticos temas.
Para cumprir este papel, tem sido comum a busca por perfis que tragam maior diversidade na composição dos conselhos. Diversidade em um significado mais amplo, incluindo gênero, idade, histórico profissional e características pessoais, por exemplo.
A combinação de maior pressão por desempenho do conselho e os desafios de integração de novos membros com perfis diferentes traz desafios adicionais para esses processos de seleção.
Passa a ser mais crítico o entendimento de quais são os principais fatores que podem impactar o desempenho esperado do conselho para, a partir disso, analisar como esses fatores devem ser considerados no processo de seleção e na escolha do perfil dos novos conselheiros.
Para ajudar o mercado a refletir sobre como impulsionar o desempenho de conselhos, sintetizamos em um framework (ver figura) os principais pontos a serem considerados no desenho do conselho e na definição do perfil de um novo conselheiro.
Na sua origem, os conselhos foram constituídos para cumprir um papel fiduciário de monitoramento dos interesses dos acionistas quando as empresas passaram a ser geridas por executivos não acionistas. Com o tempo e a evolução da governança, os conselhos ampliaram seu papel e influência na definição de estratégias e na gestão das organizações, se envolvendo em temas de risco, alocação de recursos, M&A e recursos humanos relacionados a desempenho, sucessão e remuneração. O grau de aporte e a forma de envolvimento de cada conselho em cada um desses temas muda de organização para organização, e na mesma organização também pode mudar de tempos em tempos com base no momento e desafios do negócio.
Cada empresa atua em um determinado mercado, com um determinado modelo de negócios e com objetivos e desafios distintos. Os eventos principais de transformação são diferentes e estão sujeitos a variáveis e riscos diferentes. Isso leva a contextos decisórios distintos em termos de aporte necessário, nível de pressão e de responsabilidade.
As empresas são diferentes em suas estruturas e graus de maturidade de suas governanças. As diferenças englobam questões regulatórias diferentes para conselhos de empresas de capital aberto e de capital fechado, características de concentração do controle acionário, perfil dos acionistas e controladores (investidores institucionais, empresas, fundos de private equity, fundos de venture capital, governo ou com controle familiar) e o tipo de relação de cada conselheiro com a empresa (independente, executivo, acionista ou controlador).
Conselhos, por definição, são órgãos colegiados nos quais as decisões são tomadas em grupo, fazendo proveito das diferenças de experiências e perfis dos seus membros. A composição pode apresentar graus de diferenças ou complementariedade de perfis. Por diversidade do grupo entende-se não só de gênero, mas também de experiências, capacidades, comportamentos, conhecimentos, gerações e tempo no conselho. Quanto maior a diferença, potencialmente maior a complementariedade e a riqueza do debate, podendo também levar a uma maior dificuldade de convergência de opiniões.
A ideia de um processo colegiado pressupõe que todas as decisões sejam tomadas em grupo por pessoas com igual autoridade. Na prática, há diferenças nas dinâmicas internas de cada conselho, que levam a diferenças na forma como o debate coletivo acontece e em como as decisões são tomadas. Nesse quesito, a forma com a qual o presidente do conselho organiza as pautas e conduz as reuniões influencia na qualidade do debate e no processo de tomada de decisão. Também impactam essa dinâmica o tipo de relação que o conselho tem com o CEO da empresa e na linha divisória entre as suas atuações. A presença de comitês temáticos também cumpre um papel importante para a dinâmica.
Os mandatos atuais de conselho têm sido marcados por um aumento no grau de envolvimento de conselheiros com as empresas. O que envolve mais tempo para preparação para reuniões, para participar de um número maior de reuniões de conselho, reuniões de comitês, reuniões de grupos de trabalho e para participação em programas internos de formação. Além do maior tempo dedicado, aumentou a expectativa de aprofundamento nos temas e na participação aberta no debate mesmo em situações de discordância com a maioria. Entender todos os incentivos disponíveis e não só os financeiros e garantir que atendam aos interesses do candidato à posição é crítico na atração, retenção e no direcionamento do comportamento desejado.
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